A utilização de um sistema de reconhecimento facial na Bahia, que foi comprovado em mais de mil prisões, tem sido criticada por especialistas devido ao que chama de “racismo algorítmico”. Desde sua implementação em 2018, o sistema levou várias pessoas inocentes à prisão.

A Secretaria de Segurança Pública da Bahia (SSP-BA) divulgou recentemente o balanço das mais de mil detenções, justificando que todas as pessoas identificadas pelo sistema estavam envolvidas em bancos de mandados de prisão.
No entanto, os pesquisadores argumentaram que mesmo quando alguém está listado em um mandado de prisão, não há garantia legal de que essa pessoa tenha cometido o crime em questão, o que viola o princípio da presunção de inocência. Um caso emblemático ocorreu durante uma festa junina em Salvador em 2022, quando um homem negro foi preso injustamente por um crime que outra pessoa cometeu em 2012. O verdadeiro criminoso usou o nome do homem inocente e suas colheitas digitais para se identificar.
O sistema de reconhecimento facial da Bahia não explicou como a imagem do homem inocente foi parar em seu banco de dados, uma vez que ele nunca cometeu um crime. A prisão injusta resultou em constrangimento e na perda de seu emprego.
Além da questão legal, especialistas também apontam para o fator racial como determinante na violação dos direitos constitucionais. O sistema de reconhecimento facial foi criticado por tratar de forma desigual pessoas com base em raça, gênero e etnia. A pesquisadora Ana Gabriela Ferreira destaca a falta de clareza sobre a base de dados usada para treinar o sistema e ressalta que a maioria dos perfis usados para treinamento são de pessoas negras que nunca cometeram crimes.
A advogada também enfatiza que o reconhecimento facial fotográfico ou biométrico é feito com base em critérios como “estilo de cabelo” e “estilo inferior”, o que levanta preocupações sobre o preconceito embutido no sistema e sua falta de precisão.
“Salvador, conhecido como a capital mais negra do mundo fora da África, tem uma probabilidade muito alta de experimentar erros ocasionais, e é importante destacar que esses erros não são tornados públicos porque evidenciariam ainda mais as graves falhas desse projeto, que é notoriamente racista e oneroso. Este projeto foi banido em vários países, mas o governo continua a aplicá-lo no estado“. O alto investimento na manutenção do sistema de reconhecimento facial também é alvo de críticas por parte dos especialistas.
“Se, entre 2018 e 2023, foram investidos quase R$ 700 milhões e o sistema investigado em apenas mil prisões, é realmente justificável considerar este sistema como uma prioridade de investimento? Existem lugares que não têm saneamento básico, mas possuem sistemas milionários de reconhecimento facial “, conclui Ana Gabriela.